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Niterói, RJ
Médico Veterinário que trabalha no tratamento e no estudo de distúrbios de comportamento em cães e gatos. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/9116323178127878

quinta-feira, 31 de março de 2011

LEVANTAMENTO DA SITUAÇÃO DA EDUCAÇÃO DE CÃES DE APARTAMENTO NO MUNICÍPIO DE NITERÓI-RJ


 aNA LUÍSA PEREIRA RIEDEL DE CARVALHO; GUILHERME MARQUES SOARES

ABSTRACT: Survey of education situation in apartment dogs in Niterói-RJ city. Behavior problems in dogs might be reduced if they are educated. By examining 103 questionnaires answered by their owners that live in the city of Niterói-RJ. The questionnaires contained questions about specific behaviors that indicate how much the dogs were educated. This study concluded that only 2 (1,94%) obeyed to all the basic commands such as “sit”, “lie down” or “stay”, 51 (49,51%) don’t obey to any of the basic commands and 44 (42,72%) don’t obey to any commands. The results encountered in this study mean that those dogs need to do basics training work so it could improve their and owner’s welfare.

KEYWORDS. Education. Dog behavior. Animal welfare.

 Introdução


A situação da educação dos animais é reflexo do estilo de vida do homem atual, que para suprir as necessidades de companhia, por exemplo, adquirem um animal estimação1,2. Este passa a ser considerado um membro da família: dorme junto com o proprietário, é tratado como filho, usa roupas, e se alimenta de comida caseira. Esses fatos reunidos levam o animal à antropomorfisação, que é o fato de o ser humano atribuir necessidades e sentimentos humanos aos animais1,2, o que fica bastante evidente no mercado pet, onde a cada dia são desenvolvidos mais produtos (perfumes, xampus, roupas e acessórios) e serviços (massagem, hidratação e alisamento de pêlos, e banho de ofurô) destinados a atender à demanda gerada pela antropomorfisação. Esta e outros fatores como a restrição social, o tempo de interação entre o proprietário e o animal, e a quantidade e qualidade de treinamento que recebem3, podem causar problemas como agressividade e ansiedade de separação. Alguns distúrbios comportamentais podem ser evitados se os cães receberem treinamento. Se o cão só é educado verbalmente, há chance de o animal desenvolver problemas, enquanto que no treinamento formal ou realizado pelo proprietário, podem ser evitados,3,4. O principal motivo das visitas às clínicas veterinárias especializadas é a agressividade5,6, pois afeta a vida do proprietário negativamente. Este estudo teve como principal objetivo avaliar o quanto de educação formal ou informal os cães receberam. Sua importância é estimular médicos veterinários a orientar os proprietários na educação de seus cães. Com isso, pode-se aumentar a sociabilidade dos cães e, consequentemente, prevenir uma série de distúrbios de comportamento e proporcionando bem-estar ao cão e à sua família humana.

MATERIAL E MÉTODOS


Foram aplicados 161 questionários a proprietários de cães de apartamento no município de Niterói-RJ. Nesses questionários havia perguntas relacionadas à educação do animal como: obediência a comandos, que possuía como opções de respostas os comandos “senta”, “deita”, “fica” e outros (com espaço para preenchimento pelo proprietário); se pula em visitas e/ou pessoas da casa, comportamento na rua (se anda com ou sem guia e se a puxa ou não). Características do animal com relação ao sexo, peso e idade foram abordadas. Os questionários foram distribuídos em clínicas veterinárias e lojas especializadas no bairro de Icaraí, de forma aleatória a proprietários de cães residentes em apartamentos, no período de julho a novembro de 2006. Foi solicitado que cada proprietário respondesse apenas sobre um animal, caso esse convivesse com mais de um em casa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Dos 161 questionários distribuídos, 103 foram respondidos pelos proprietários. Apenas 2 (1,94%) animais obedecem aos comandos básicos de adestramento (senta, deita e fica) e andam na rua sem puxar a guia. Em contrapartida, 51 (49,51%) dos proprietários relataram que seus cães não atendiam a nenhum comando básico e 44 (42,72%) não obedeciam a nenhum comando. Individualizando comando a comando, 37 (35,92%) obedecem ao senta, 22 (21,36%) ao deita, 26 (25,24%) ao comando fica, e 7 (6,80%) obedecem a outros comandos. Em relação ao puxar a guia durante os passeios, 49 (47,57%) dos cães andam na rua puxando a guia. Combinando os resultados de puxar a guia e dos comandos básicos de adestramento, 30 (29,13%) não obedecem a nenhum comando formal e andam na rua puxando a guia. Os resultados em relação ao pular nas pessoas em casa foram: 24 (23,30%) somente pulam nas pessoas da casa, 13 (12,62%) somente pulam nas visitas e 41 (39,81%) pulam em visitas e pessoas da casa. Combinando os resultados de pular nas pessoas, puxar e guia e obedecer a comandos básicos, 22 (21,36%) pulam nas pessoas, não obedecem a comandos básicos e puxam a guia durante os passeios na rua (Figura 1). Em relação ao sexo, 51 eram fêmeas e 52 machos e não houve predisposição em relação ao sexo com nenhum comportamento observado. A média de peso dos animais da amostra foi de 8,79kg e a de idade foi de 5,89 anos, sendo que 2 proprietários não informaram a idade do animal. Os resultados encontrados nesse estudo para animais que obedecem a comandos e que pulam em pessoas da casa são menores que os citados na literatura3. Isto porque, em países desenvolvidos há uma maior preocupação com o adestramento devido aos padrões culturais da população. Por exemplo, na Austrália a maioria dos cães vive confinada em quintais pelo medo de desenvolvimento de agressividade3. Há uma compatibilidade no resultado quando se refere à proporção de animais treinados na população e a apresentação de problemas de comportamento, pois, aparentemente, menos animais receberam treinamento3. Nesse estudo foi encontrado um número menor de animais educados do que os não educados, estando de acordo com os resultados da literatura, porém o resultado de animais educados encontrado nesse estudo (1,94%) é menor do que o encontrado na literatura (20,3%)7. Com relação à idade, são animais em sua maioria adultos e continuaram exibindo comportamentos naturais de filhotes6. E em relação ao peso, os resultados obtidos demonstram que os animais da amostra são em sua maioria de pequeno porte, o que implica em menos danos quando estes pulam nas pessoas ou puxam a guia durante os passeios. Dados da literatura estão de acordo com este estudo na questão do peso e porte do animal, cães menores apresentam maior excitabilidade7. Por hipótese, o porte menor facilita o controle desses cães pelo proprietário quando chega em casa e durante os passeios na rua. Outro estudo diz que alguns animais que receberam educação formal apresentaram menor excitação durante os passeios e são mais educados comparados àqueles que não receberam8, o que está em acordo com este estudo. Outro aspecto que merece mais pesquisas é o paradoxo entre o antropomorfismo e a busca pela educação dos cães. O antropomorfismo, como é citado na literatura1,2, faz com que os animais sejam tratados como humanos, porém a necessidade de educação ou ficou negligenciada nos animais deste estudo ou então esses cães compartilharam um problema comum no processo educacional, que é a dificuldade das atuais gerações em estabelecer limites às crianças9 , o que pode ter se estendido aos cães. Os resultados deste levantamento demonstram a necessidade de um processo básico de educação dos cães, o que surtiria um impacto positivo na qualidade de vida desses proprietários e de seus cães.

FIGURAS


Figura 1 – Parâmetros de obediência básica dos cães de apartamento do município de Niterói – RJ, no período de julho a novembro de 2006.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1.     FUCK, E.J.; FUCK, E.T; DELARISSA, F.; CURTI, C.E. Nosso Clínico, 9 (49): 46-58, 2006.
2.     FARACO, C. B.; SEMINOTTI, N. Revista do Conselho Federal de Medicina Veterinária, 32: 57-62, 2004.
3.     KOBELT, A.J.; HEMSWORTH, P.H.; BARNETT, J.L.; COLEMAN, G.J. Applied Animal Behaviour Science, 82: 137-148, 2003.
4.     TAKEUCHI, Y.; OGATA, N.; HOUPT, K.A.; SCARLETT, J.M. Applied Animal Behaviour Science, 70: 297-308, 2001.
5.     DENENBERG, S.; LANDSBERG, G.M.; HORWITZ, D.; SEKSEL, K.. In: MILLS, D.; LEVINE, E.; LANDSBERG, G.; HORWITZ, D.; DUXBURY, M.; MERTENS, P.; MEYER, K.; HUNTLEY, L. R.; REICH, M.; WILLARD, J. Current Issues and Research in Veterinary Behavioral Medicine. Indiana: Purdue University Press, 2005, p. 56-62.
6.     LANDSBERG, G.; HUNTHAUSEN, W.; ACKERMAN, L. Problemas Comportamentais do Cão e do Gato. São Paulo: Roca, 2004. 492p.
7.     BENNETT, P.C.; ROHLF, V.I. Applied Animal Behaviour Science, 102: 65-84, 2007.
8.     JAGOE, A.; SERPELL, J. Applied Animal Behaviour Science, 47: 31-42, 1996.
9.     ZAGURY, T. Sem padecer no paraíso. Rio de Janeiro: Record, 2002, 208p.




Trabalho apresentado em forma de pôster na VIII Conferência Sulamericana de Medicina Veterinária - Rio de Janeiro - 2009

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